segunda-feira, janeiro 17, 2011

FALANDO SÉRIO COM DIEGO KA.- Reprise porque sumiu do blog de forma indecente.Apertei o botão para letras maiúsculas e...não sei para onde foi.


1-Qual a tua primeira lembrança  deste interesse pelas artes visuais?
5 ou 6 anos, no "jardim de infância". Em uma semana, fiz o mesmo desenho todos os dias: uma casa e um pássaro com uma flor no bico. O primeiro desenho começava com o pássaro à esquerda da página. Nos desenhos seguintes, ele foi "voando pela folha" até chegar à direita. Acredito ter sido minha primeira noção de animação.

 2-Comentava contigo a respeito de autoria. Percebe-se que tu és um homem “ mordido” pelo teu trabalho.Quero dizer que o que fazes está estranhado em ti, que o que produzes tem autoria, tem a tua marca.Pois bem...Concordas comigo?Como percebes a tua autoria naquilo que compõe um trabalho?
Sim. O que eu faço geralmente envereda pelo fantasioso, pelo lúdico. Talvez seja um protesto à sermos "só isso que somos". Ou vestígios da pureza da infância que resistem ao tempo. Ainda não cheguei a uma conclusão se os trabalhos que faço são prisão ou liberdade. Prisão porque sem os trabalhos não sei se teria um "eu". Existe um Diego que não está associado ao eu trabalho? Consigo acordar amanhã e dizer: "Hoje vou largar tudo e virar agricultor"? Liberdade porque cada trabalho novo vem com uma pergunta que desfaz as respostas prontas até então.

3-Por que Diego Ka?
Na condição de homem mordido, mordi meu sobrenome =D

4-A primeira vez que tive contato com tuas idéias foi na criação da capa do Chá das Cinco.Percebi que me perguntaste sobre algumas coisas, sobre algo do texto, algumas palavras chaves e, de pronto, compuseste a belíssima capa do livro.Pois é...o que move teu trabalho de criação?As cores, as palavras, percepções?
Penso que todo trabalho criativo verdadeiro é espontâneo. Até tenho dúvidas se o artista é realmente dono do seu trabalho, visto que sua imaginação entrega o caminho pronto. Michelângelo exemplificou bem: "A figura já está na pedra, trata-se de arrancá-la para fora". Procuro manter a imaginação bem nutrida: ao invés de olhar reto e objetivo pras coisas, me perco nas percepções periféricas. Depois, as perguntas e palavras-chaves  apontam a direção, e a imaginação dá a resposta. Nesse cenário, sou apenas a ferramenta.



5-Quais as coisas mais importantes para ti?
Não vivi o suficiente pra definir o que é realmente importante, ou descobrir, ou me conformar. A importância das coisas é volátil e efêmera. Um grande amor pode tornar-se uma pálida lembrança. Uma profissão pode resultar na confissão de que não faz mais sentido. De todas as coisas, perguntar e ter dúvidas parece a mais importante no momento. Verdades e caminhos prontos hermeticamente fechados em palavras e entidades absolutas aborrecem e emburrecem. Atualmente considero importante a transformação, valorizo e prezo a transformação. E quando encontro respostas pras coisas, me pergunto se não estou ficando ignorante.
 6-Quais as principais dificuldades de Diego Ka?
Algumas vezes, carecer da técnica necessária para realizar determinado trabalho que foi imaginado.  Ter o domínio da técnica para concretizar a imaginação com esmero é um ato de respeito a si mesmo.
7-Num texto teu que eu li, escreves sobre as diferenças. Fala em cores, em pensamentos, neste abismo que é próprio ao ser humano: o que sinto,vejo ou falo não determina como o outro vê, escuta ou fala.Pois é...percebe-se uma certa ética a respeito do cuidado com o outro. Como lidas com isto já que trabalhas com imagens e criação e sempre estas coisas estarão alheias ao que, de fato, imaginamos?
Não faço coisas pensando no que os outros irão pensar, porque não sou "os outros". Não tenho a carga de memórias e emoções deles pra ficar delimitando "isso é bom"  e "isso não é bom". Tenho apenas a minha carga de memórias e emoções. Embora o trabalho de criação seja egoísta, a percepção é coletiva. O que procuro é respeitar e atender ou superar a expectativa coletiva no tocante satisfação, geralmente com temáticas benignas, emotivas, belas. O meu norte vem de símbolos universais (um sorriso é um sorriso e uma coisa boa em qualquer lugar do planeta) e percepções de massa (você pode realmente odiar rap e amar Beethoven, embora outras pessoas adorem rap; mas um rapper pode dizer com sinceridade "Beethoven é a pior coisa que já escutei, isso fere meus ouvidos"?)

8-Quais os trabalhos teus ou em parceria que poderias citar ?
Sempre gostei muito dos trabalhos de computação gráfica, como as aberturas de programas produzidas para a TV Cultura de Montenegro desde sua inauguração, e a TV Mais de Novo Hamburgo. Algumas ilustrações renderam um espacinho na memória, como uma campanha pra Gasoline (marca de roupa) e outra pra Souza Cruz, com pinturas a óleo de animais. Na produção de vídeo, um que teve um resultado bem satisfatório foi o 2º Caderno Pedagógico, para a Fundarte. Algumas capas de livro também foram divertidas de fazer, como a tua (Chá das 5), do Carlos Leser (In Extremis) e do Pedro Stiehl (Rapsódia em Berlin). Nem sei se eu posso falar isso, mas a mão que aparece na capa do livro do Stiehl é do Mister, que freqüentava o Café Comercial.  Eu falei pro Ângelo (Daudt, fotógrafo): "Cara, preciso duma mão, LITERALMENTE" heheh e ele me veio com essa.
9-Quer deixar registrada alguma coisa mais?
Virou Cartório agora pra ficar registrando coisas? hehehe
Agradeço muitíssimo tua entrevista. É de fato um prazer teres aceito ser meu convidado. Andiamo,Diego.Andiamo!
Beijo com todas as letras

4 comentários:

  1. Bom ler e conhecer mais sobre este artista plástico, e concordo com Diego: temos que manter a imaginação bem nutrida... sem ela seremos mera cópia de outros e outros e outros.

    Bom conhecer quem criou a capa de Chá das Cinco Adriana e tu estás te revelando uma ótima entrevistante( entrevistadora atuante, ativa, que instiga, provoca e comunica )

    Parabéns aos dois e beijos com todas as letras.

    Carmen.

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  2. "perguntar e ter dúvidas parece o mais importante" também pra mim.

    Gostei muitíssimo da entrevista.

    Destaco o ponto em que o entrevistado afirma:

    "Não faço coisas pensando no que os outros irão pensar, porque não sou "os outros". Não tenho a carga de memórias e emoções deles pra ficar delimitando "isso é bom" e "isso não é bom". Tenho apenas a minha carga de memórias e emoções. Embora o trabalho de criação seja egoísta, a percepção é coletiva. O que procuro é respeitar e atender ou superar a expectativa coletiva no tocante satisfação, geralmente com temáticas benignas, emotivas, belas. O meu norte vem de símbolos universais (um sorriso é um sorriso e uma coisa boa em qualquer lugar do planeta) e percepções de massa (você pode realmente odiar rap e amar Beethoven, embora outras pessoas adorem rap; mas um rapper pode dizer com sinceridade "Beethoven é a pior coisa que já escutei, isso fere meus ouvidos"?)

    Destaco não por ser este o ponto em que mais me identifico, mas porque encontro aqui uma contradição interessante.

    Ao mesmo tempo em que o entrevistado diz que não pode apontar o que "é bom" e o que é "não é", também declara: "um sorriso é um sorriso e uma coisa boa em qualquer lugar do planeta".

    Um sorriso é um sorriso?, eu me pergunto. Será mesmo um sorriso o que se esboçou no rosto da Monalisa?

    Além disso é sempre bom um sorriso, mesmo aquele que expressa ironia?

    Interessante pensar a respeito.

    É questionável a noção de "símbolos universais". Branco nem sem é paz. Preto nem sempre é luto.

    Está vendo como nos fazem pensar as entreVistas?

    Geniais as respostas. Sobretudo a que foi dada a primeira pergunta. Uma pintura!

    Lindo, lindo.

    Parabéns Adriana. Parabéns ao artista.

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  3. esqueci de perguntar: o entrevistado tem também um blogue?

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  4. Oi
    Universal é sempre a forma como o outro recebe o sorriso, a voz, o olhar, a palavra...universal é todo o Outro.
    PS: Acho que o Diego não tem blog.Ele tem uma empresa de criação aqui na cidade.Fez um filme bem legal que ganhou alguns prêmios.Envio por email algum contato dele.
    beijo Márcio
    adriana bandeira

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