quinta-feira, junho 30, 2011

Estrada de Ferro, olhos da construção...( continuação)

Se a violação plantava no ventre,também erguia o verso transparente, como a água primeira que encheu os pulmões.Carregava como traço, firme compasso,a ternura que falava outra língua acudida, enquanto manchada de puta, mulher, vadia.O pai percebia a evolução da barriga e a dor da mãe nem falava, nem anunciava, nem sorria.Apenas num dia olhou-me com tanto amor que quis crer o que na verdade nasceu depois: tens novidade, disse ela, esta que abriu a estrada e que nunca mais volta sem dor.Roupas e panelas no pequeno riacho, eram recriadas no tacho, gamela que recolhia o suor das tardes e dos lençóis.O ferro da rasura, cantando múscia em dó de duas, as migalhas do ruivo inglês.Andou em círculos e me chamou: sei que o filho é do Engals.Disse que sim e que não.O filho era do trem que viria, um dia, como o fez.

segunda-feira, junho 27, 2011

uma vez

Gosto de cheia de rio que traz barco, seio,traço verdade que não se contem.Gosto do que trasborda, refaz caminho,costura parto que faz nascer.Mas, por alguma vertentente, cheia de rio acontece só uma, a cada vez.

quinta-feira, junho 23, 2011

Tempo de árvore

Ouça-me bem, que nos abre a revolta em tantas partes, que por hora no tempo se fecham também, o que do sonho antes nos inventou.Repara que ao assassinar, " drogar", atam-se nós de obediência que nunca morrem se não os findamos...que em parte só revolucionamos quando nos pomos a amar os outros, nas suas vozes de antes  e depois.Ah!Então nada há de ser obediência quando a ordem da ciência é pura morte da invenção!Plantar nem é tecnológico pois que faz do tempo uma estação.Somos a lei que deseja um rastro, fio espaço de colheita em rio de cheia,somos as macieiras que nesta época anunciam um saber.

Noite sem fim

A longa noite dos dias, as horas da falta de sonho, de ventre que sinta.São as mesmas da primeira ferida que me fez morte e vida,nascer como qualquer palavra, como uma esquina estrada de antes depois de mim.

Desenha-me

Beija-me onde me dói a verdade, palavra que me fez estranha,diferente e pertencendo a ti.Beija-me onde desenhas meu corpo com o que me falta, o que me fazes ficar ou partir.Beija-me apenas...para que eu possa existir .

Eu mesmo falando

E quando eu apanhava eu dava...quando ardia eu sangrava o Outro, a cada nova aparição.E sempre, que não me engane nenhum doutor, nada disso vai passar.Sou esta pequena solidão.Ah!, sim...e sou também o que quiser de mim.


Antes de viver, 12 anos.
(adriana bandeira)
PS:o marcador vozes é resguardado a este trabalho em que escrevo como outro ou outra, numa tentativa de registrar vozes tantas,
de qualquer um.

Cães

E no meio da noite recebo um chamado estranho.Os cães sempre avisam sobre o abandono.

a alma do pão

Sobre o livro,
a mesa.
Sobre a mesa,
a certeza
de que o pão nunca
esteve fora
da alma.

escolha

Ainda que me falta a lembrança,a liberdade,a gratidão... que nunca me falte a rima, o som, a esquina em que possa ao menos dizer sim ou não.

Semente de gente

Gosto das sementes
e óvulos e esperma
de gente
é toda palavra
que perpetua
o grão.

domingo, junho 19, 2011

UM OLHAR SOBRE A CIDADE...LÁ DE CIMA VEMOS O CAIS: conversando com Pedro Jalvi

1-Pedro Jalvi...Lá de cima se vê o quê?Se sente o quê?Dá para falar?

Lá de cima a gente vê como tem pessoas pequenas que, no entanto, imaginam ser grandes.
Vemos, também, que nem tudo é tão grande que não possamos ficar acima. Afora isso, o
estar lá no alto, voando, é das melhores sensações que o ser humano pode experimentar.
Além da autoconfiança temos de confiar no equipamento; é preciso a noção exata do que
se está fazendo; e quais são os nossos limites. Quem voa, sem sombra de dúvidas, é um ser
humano diferenciado. E muito melhor.




2-Depois de muitos anos te reconheci numa foto estranha, no Orkut, em que estás junto a uma
aparelhagem esquisita.O que é?Precisamos saber!

É um pára-motor. Simplificando: trata-se de um motor aeronáutico que vai conectado às
costas do piloto através de um equipamento. A “asa” é um parapente. É a menor aeronave
motorizada capaz de transportar pessoas, que temos por aí. Eu voava com um equipamento
destes. Vendi-o devido a uma crise financeira.

3-lembro do Netojos II !rsrsrsrsrsrs...Aquele grupo de teatro que reanimava as artes
dramáticas de nossa cidade depois de muito anos.Estamos ficando velhões , hein Jalvi?
rsrsrsrsrs.Pois é, não lembro direito quais os personagens, qual o texto na época.Porém, vou
te confessar, que lembro da tua voz! rsrsrsrsr.Era o comentário das atrizes nos bastidores!
rsrsrsrsrsrs.Outra hora conto mais das coisas que falávamos...sobre a tua voz.Ou não
conto,jamais!rsrsrsrsrrsPois bem...para ti Jalvi, o que é ter uma voz que causa gosto aos
outros?

É, e lá se vão trinta anos...Bah, devias ter me contado na época sobre os cochinhos nos
bastidores... Eu era tímido pra caramba, embora já trabalhasse em rádio e fazendo teatro.
Quando me elogiavam ficava tão vermelho quanto um pimentão. Pois, é! A minha voz
continua a mesma, mas, em compensação, os meus cabelos... Adriana, eu sempre digo que
para apagar a história só matando os velhos. Pois bem, esta alusão ao Grupo Netojos II (não
esquecendo que nos anos 40/50 houve o Netojos I), nos remete ao fato de que Montenegro
foi muito mais rica artística e culturalmente do que é hoje, e, no entanto, agora é que a
chamam de “Cidades das Artes”. De alguma forma este passado precisaria ser resgatado - e
devidamente registrado - para que a geração atual e as futuras saibam que nem tudo por aqui
foi a mediocridade que se vê hoje.

4-Costumo dizer que a voz é o sujeito.Nos seus diferentes discursos, nas suas diferentes
posições e endereçamentos.Porém, ocorre que quem narra um fato, principalmente num
veículo de imprensa, de propagação da notícia, precisa, imagino, nãos e apresentar tanto, não
comover-se tanto.Como é, para ti, dizer-se, aos ouvintes?


Olha, Adriana, cada situação é uma situação. Eu sempre digo para quem está começando: no
rádio a entonação da voz, numa locução, pode se tornar um editorial; na televisão, uma
expressão facial - além do tom de voz -, da mesma forma, será interpretada como uma
opinião. Mas as minhas experiências, através da voz, são muitas e riquíssimas. No rádio
profissional ,antigamente, só uma boa voz não bastava. O talento, como um todo, era

fundamental. Tempos atrás (hoje isto já quase não existe) se criava uma relação de muita
confiança entre o ouvinte e o locutor, o comunicador. Ao longo da minha carreira vivi
situações riquíssimas deste envolvimento, desta relação estreita com os ouvintes. O meu
trabalho em rádio sempre foi além da notícia (também era a notícia, é claro). Eu nunca fiquei
no ar menos de cinco horas consecutivas, de segunda à sexta. Os meus programas sempre
iniciaram às sete horas da manhã e se estendiam até o meio-dia. Imagine, então... a gente
passava a ser quase um familiar dos ouvintes. Hoje se fala muito no Zambiazi, mas este
trabalho desenvolvido por ele, fazíamos muitos anos antes. A diferença é o fato dele atuar
dentro de Porto Alegre e com o respaldo da estrutura da RBS. Para quem trabalhava no
interior se tornava muito mais complicado. Adriana, vivi fatos emocionantes, decepcionantes,
alegres, tristes, indiferentes, enfim. No rádio que eu faço, o dia de hoje não é igual ao de
ontem e nem será ao de amanhã. Para teres idéia deste envolvimento, já vivi o caso de uma
adolescente condenada à morte por uma doença incurável que dizia não aceitar morrer sem
me conhecer pessoalmente; de uma senhora idosa (já falecida) que, por vontade dela, tornou-
se “vó adotiva” dos meus filhos e os tratava como se fossem netos de sangue. Também passou
a cuidar de mim como a um filho. Ela, uma senhora culta, dizia que os filhos legítimos não lhe
davam a mesma atenção que eu dedicada à ela. Olha, foram tantas histórias bonitas nestes
mais de trinta anos. E em várias cidades. Hoje em dia nos Facebook e Orkut da vida, pessoas
me localizam e, num primeiro momento nem sei de quem se tratam, mas daqui há pouco
começam a descrever situações e eu acabo ligando-as a estes acontecimentos proporcionados
pelo rádio. Tenho muitas histórias bonitas e se fosse narrá-las aqui não haveria espaço
suficiente no teu blog. Já na parte jornalística, propriamente dita, também vivi situações
grandiosas. Antes de completar vinte anos de idade, já havia entrevistado presidente da
República, o general João Batista Figueiredo; consegui entrevista exclusiva com o governador
do Estado, Amaral de Souza (naquele tempo isto era quase impensável, devido ao regime
militar, pior ainda para um “pós-adolescente”). Fazer jornalismo era mais do que cumprir
expediente e apresentar um trabalho qualquer. Era viver aventuras. De todos os tipos. E hoje
quando eu vejo a gurizadinha da Imprensa(e não só nos veículos de Comunicação do interior,
nos grande também), em sua maioria medíocres, “arrotando” como se fossem os “caras”, fico
indignado. Como já disse anteriormente, sobra tecnologia e falta talento. O rádio, jornal e tv
não me deram dinheiro, mas, com certeza, proporcionaram grandes, enormes emoções.
Parodiando Roberto Carlos, eu posso dizer em alto e bom som que emoções eu vivi!

5-A tua paixão por voar...no teu tão esperado texto de encontro ( rsrsrsrsrrs), quando
aceitaste o convite para Indecentes palavras, relatas teu sonho de menino de ...voar.E aí, como
encaminhaste isso?

A minha paixão por tudo o que voa começou quando criança. Eu morava no Passo da Cria,
próximo a uma das cabeceiras da pista de pouso e decolagem do Aeroclube de Montenegro
(naquele tempo lá era interior do município). As minhas brincadeiras, em cima das árvores,
eram “de avião”. Eu saltava do telhado da casa com guarda-chuvas, simulando pára-quedas.
Quando nos mudamos para a cidade, casualmente passei a residir ao lado da casa do falecido
Paulo Streb, que era piloto e pára-quedista. Ele me oportunizou voar as primeiras vezes no
avião Paulistinha que havia no Aeroclube. Lembro até hoje a matrícula da aeronave: PP-RPJ (as
duas últimas letras, iniciais de Pedro Jalvi). Eu só não fui, aos 13 anos de idade, para a Força
Aérea Brasileira porque a minha mãe não permitiu. Queria ser piloto da Esquadrilha da

Fumaça. Bem, o sonho de ser piloto de avião se perdeu nas dificuldades financeiras para
custear um curso. Mas aos dezessete anos me tornei pára-quedista, esporte com o qual
também sonhava. Foi em Caxias do Sul. Vivi o pára-quedismo por mais de vinte anos. Mas a
prática deste esporte era bem diferente dos dias atuais, por vários aspectos. Desde a questão
segurança até os tipos de equipamentos. Atualmente, podemos dizer que é uma atividade
quase cem por cento segura. A tecnologia domina a fabricação de equipamentos. Para teres
uma idéia, no tempo em que fiz o curso levávamos quase seis meses do início das aulas até o
primeiro salto. Hoje, tu chegas pela manhã na área de salto e à tarde já fazes o primeiro salto
livre, acompanhado de dois instrutores. Nas “antigas” a gente saltava em queda-livre e ao
comandar o pára-quedas ficávamos torcendo para que o “redondão” abrisse, pois panes eram
comuns. A navegação do velame, um suplício; e a aterragem, uma incógnita. Mas havia mais
beleza em tudo. Era romântico. Tem um filme bem antigo (baixei na Internet), que assisto
quando bate a saudade daqueles tempos. O nome é “Os Pára-Quedistas Estão Chegando”,
com o Burt Lancaster. A estória se desenrola de forma muito semelhante ao que fazíamos,
viajando por várias cidades em atividade de saltos. A cada fim-de-semana novas aventuras.
Os “pqds” eram recebidos nas cIdadezinhas como verdadeiros heróis. As crianças tocavam na
gente para ver se éramos “de verdade”! Tudo muito bonito. Tenho saudade. Parei com o
pára-quedismo quando as áreas de saltos viraram “área de negócios”; os clubes se
transformaram em empresas e a prática do esporte passou a ser coisa para a elite financeira,
tais os custos que passaram a ter. Não era mais para mim. Afora isso, comecei a ver os
caras “fumando” coragem para saltar. Sempre detestei drogas. Não as aceito sob qualquer
pretexto, muito menos no esporte e num esporte como este, de alto risco. Paralelamente ao
pára-quedismo, conheci o vôo livre. No final dos anos 80 comecei um curso de pilotagem de
asa delta, em Igrejinha, (eu morava, então, em Taquara),mas não continuei devido à mudança
de cidade. Mais adiante surgiu no Brasil o parapente (que é primo em segundo grau do pára-
quedas e parente distante da asa delta). Fiz uns treinamentos e uns vôozinhos, mas, devido a
nova mudança de cidade, não continuei. Alguns anos depois retomei o vôo em parapente.
Neste ano estou parado face à alguns percalços, mas pretendo recomeçar em breve. Em
síntese (nem tão sintética assim) é isso. Mas continuo um apaixonado por aviões e por tudo
que voa, e, hoje, o computador também me permite voar diversas máquinas por vários céus...

6-A cidade e a voz...é algo assim como acostumarmo-nos coma s esquinas e as pequenas
praças.Então, existem aqueles que falam em função de um ideal político, de algo que requer
a denúncia....E outros falam porque amam o lugar onde nasceram e fazem da sua voz, a dos
outros.Estas seriam posições apontadas por mim, é claro.Mas tu,Jalvi...de onde tu falas?




Adriana, ao longo de 34 anos (comecei com pouco menos de 14 anos de idade, acreditem!
) o meu ideal sempre foi fazer algo pelos menos favorecidos; dar voz àqueles a quem nunca
possibilitaram o direito de expressão. Muitas pessoas pensam que o Jalvi brigão (no bom
sentido e, às vezes, no mal, também); que diz aquilo que outros não têm coragem; que coloca
o dedo na ferida; que “mete a mão” nos grandões, surgiu ontem (porque fiquei década e meia
fora de Montenegro). Nada disso. Eu iniciei profissionalmente já fazendo “bronca”! Nem 15
anos eu tinha quando duas viaturas da Brigada Militar foram me prender no estúdio da Rádio
América (tempos da ditadura militar), numa operação com direito à sirenes abertas, carros
entrando na contra-mão, homens armados até os dentes descendo das “pata-chocas” (como
eram chamadas as viaturas à época), tudo porque critiquei com veemência e a indignação de

adolescente, já inconformado, a BM e o Exército, porque militares mataram um motoqueiro
pelas costas, em Passo Fundo, e, depois, quando dos protestos, teve a matança de meia
dúzia de manifestantes. Anos mais tarde o destino me levou àquela cidade, onde fiz um
pouco de história também. Nas muitas outras cidades por onde passei não foi diferente.
A minha trajetória no rádio, tv e jornal, daria um livro de muitas páginas. Só que a minha
cidade, infelizmente, não me conhece profissionalmente e nem a minha história. Ainda por
cima, alguns babacas, do mesmo meio profissional, e também de fora, sempre procuraram
diminuir ou abafar esta trajetória. Motivados por ciúme e inveja, sentimentos que sempre
acompanham os incapazes. Então, Adriana, de onde eu falo? Eu falo de onde ninguém quer ou
não gosta de falar, por falta de coragem, de argumentos, de honestidade ( e esta é a palavra
mágica: honestidade). Eu falo -e falarei ainda mais quando a Montenegro FM estiver no ar -
por este povo que continua sem voz diante de tantos poderosos que não só tem direito à voz,
como, aproveitando este “direito”, gritam bastante sem que alguém faça um contraponto no
mesmo tom e volume.

7-Sobre as falas e suas vicissitudes...Dizem alguns que as mulheres falam demais
rsrsrsrrsrs.Dizem alguns que elas dizem a verdade rsrsrsrsrsrs.Ocorre que, existem estudos,
as más línguas, como gosto de dizer, que às mulheres está dado um lugar de falta de
reconhecimento, vindo a ser suprimido somente, para algumas, se um homem as escuta
fazendo valer o que foi dito.De forma sutil e nem sempre...,veja bem! Nem sempre!, concordo
com isso.Assisto algo assim os mais diferentes âmbitos.O que achas disso?

Adriana, se nós, os homens (falo “homem”, no sentido sexo masculino) ouvíssemos mais as
falas das mulheres, faríamos menos besteiras, tenha certeza. A mulher tem mais sensibilidade,
e, parece, “vê além” para e em tudo. Se no decorrer da minha vida tivesse ouvido mais as
mulheres, menos besteiras fariam parte do meu curriculo. Com certeza!

8-Ao longo dos anos o que mudou por aqui?

Montenegro cresceu (só geograficamente que não. Ao contrário, diminuiu bastante), o
dinheiro trocou de mãos, surgiram novas oportunidades, etc. Mas gostem ou não, a verdade
é uma só: a mentalidade da maioria continua a mesma coisa. Medíocre. Putz, acho que isto
é coisa de “DNA” do município. Como disse, fiquei quinze anos fora e vi e vivi muitas outras
cidades, com povos diferentes e diferenciados. Depois retornei e a mentalidade reinante não
havia se alterado. Em algumas situações até piorou. Quando da volta, residindo novamente
aqui mas trabalhando em outros municípios, acontecia aquele choque: durante a semana
convivia com um tipo gente e sua maneira de pensar; aos fins de semana, na minha terra, algo
totalmente diferente. Aqui é preciso ser meio como Dom Quixote, lutando contra moinhos de
vento, e se trata de uma luta totalmente inglória. Como gosto da minha cidade, e nesta altura
do campeonato não vou mais trocá-la, resolvi relaxar e... Mas às vezes perco a paciência,
principalmente quando vejo uma nova elite econômico/financeira/política, sem cultura, sem
vivência, sem nada de bom para oferecer, usando o “zé povo” como escada para subir ainda
mais alto. Também a elite de outrora, hoje decadente, usando dos mesmos expedientes
para tentar se manter, de forma desesperada, nestes lugares elevados. Me indigno mesmo.
E mais “louco” fico quando vejo uns bobões, pensando serem espertos – mas na verdade são
meros instrumentos - dando guarida a este tipo de coisa. Imaginam ser inteligentes, mas, na verdade, são uns burrões, trouxas. O que é bem pior.




9-Assisti ao filme feito pelo Adriano Alves,Leandro Gonçalves e outros...Aquele dos
Crisóis.Muito legal! Crescestes enquanto ator,não?Como é este teu envolvimento com a
representação?A voz é uma forma de representar?Como forma as filmagens?

Adriana, depois que fiz teatro em Montenegro, acabei em Taquara. Lá, tinha a Ângela
Gonzaga, atriz de teatro premiadíssima(irmã dos professores Sérgius e Régis Gonzaga), que
integrava um famoso grupo de Porto Alegre (não recordo o nome agora). A Ângela, reiteradas
vezes me convidou para fazer teatro, com o devido aperfeiçoamento, é claro, em Porto Alegre.
Não quis. Talvez tivesse dado certo e seguido carreira. Mas sabe daquela história de ter um
passarinho na mão ao invés de dois voando? À época já estava com filhos e não podia correr
riscos. Mas o rádio também é um exercício diário de interpretação. Tu precisas fazer com que
o ouvinte “veja” aquilo que estás falando. A narração esportiva, por exemplo (narrei futebol
profissional por mais de vinte anos), é um exemplo. Tu tens que contar em velocidade as cenas
que passam rapidamente à frente dos teus olhos, sem errar, dosando na emoção,
interpretando o acontecimento no momento exato, fazendo projeções dos instantes
seguintes, e tudo de forma muito equilibrada. Ah, e sendo submetido a julgamento por
milhares de pessoas cara a cara, dentro do estádio. Tem de ser “artista”, não tenhas dúvida.
Bem, mas depois, nos anos 90, fiz muito comercial de TV como ator e locutor. Como os anos
não perdoam, o tempo passou, o cabelo escasseou e a balança indicou que a fase estava por
acabar. A etapa de “galã mexicano” se expirara. Nestes períodos surgiram muitos convites
para vôos mais altos, como São Paulo e Rio de Janeiro. O meu temor sempre foi o de arriscar
tendo crianças pequenas (fui pai muito jovem) e, ao mesmo tempo, guardava no meu íntimo
aquela imensa vontade de voltar para Montenegro, ficar próximo dos familiares, e ter “uma
casinha branca com varanda, um lugar de mato verde pra plantar e pra colher” (música do
Gilson). E que continua sendo o meu sonho... Eu andava por diversas geografias, mas sempre
com o pensamento e os olhos voltados para Montenegro. Agora, depois das voltas do mundo
e das voltas que o mundo deu (outra música, esta do Demétrius), me arrependo de não ter
arriscado. Refletindo friamente acho que teria me saído bem. Talvez hoje eu pudesse ser um
vilão da novela das nove, não é? Queres que eu seja sincero? Me arrependo muito, mas muito
mesmo, em ter retornado para Montenegro, rejeitando oportunidades para as quais outras
pessoas dariam qualquer coisa em troca para tê-las. Não valeu à pena mesmo, embora esteja
tentando, e faz tempo, aplacar os prejuízos causados por estas escolhas. Aliás, em última
instância, nós somos frutos das nossas escolhas, não é mesmo? Mas, voltando ao assunto
propriamente dito: tivemos aquelas experiências com os filmes do Adriano Alves de Oliveira.
Pena que as boas iniciativas em Montenegro morrem na casca. Hoje, com o advento da TV
Cultura, e com os recursos técnicos disponíveis seria bem mais fácil produzir outros filmes,
curta-metragens, mini-séries, tele-teatros, etc. Esta idéia dos filmes locais deveria ser
retomada. Eu sempre quis fazer um curta-metragem em cima do conto “Um Dia a Lua Cai”, do
Pedro Stiehl, mas, infelizmente, ficou só na vontade. Hoje em dia com este fundo de incentivo
à Cultura, em Montenegro, até daria para retomar a proposta, mas, imagine, quando vissem
na documentação Pedro Jalvi Machado e Pedro Stihel, os “pedros” acabariam
levando “pedradas” e não dinheiro... Para uns e outros que mexem com “cultura” por aqui,
nós ainda somos malditos. Mas veja que beleza aquela produção do Paraguaio, em parceria
com o Diego K, numa música e letra do Pedro Stiehl (o vídeoclip “Não te Culpo”, no Youtube).

Quer dizer: em Montenegro o que não falta é gente de talento, mas talento este que, via de
regra, é abafado pela mediocridade...

10-As mulheres...O que é amar uma mulher?É possível?

Vai da calmaria ao turbilhão. Mesmo assim, se isso não fosse possível, o mundo seria em
preto-e-branco.

11-A cidade, a mulher...encontra semelhanças?Quero dizer, quando falas para A cidade...é
uma forma de amar?

Ah, eu e Montenegro tem sido um grande caso de amor não correspondido. É desigual. Só eu
amo. Mas acredito que em breve vou conquistá-la e haverá reciprocidade neste sentimento. E
isto vai se dar através da Rádio Montenegro FM, que em breve estará no ar.

12-Sabendo da nova rádio...Poderia contar um pouquinho do processo de criação disso?

Adriana, quanto eu tinha vinte e dois anos de idade já era sub-gerente de rádio. Logo depois,
fui alçado à gerência e, de lá para cá, dirigi seis emissoras de rádio, quatro dentro do mesmo
grupo de Comunicação. Antes disso tinha sido apresentador de telejornais. Também fui editor
e diretor de jornais. Trabalhei em agências de publicidade. Enfim, fiz de tudo em Comunicação.
Neste setor ganha dinheiro quem vende, e bem, publicidade. A minha praia nunca foi vendas,
mas criação, produção, etc. A minha especialidade era pegar um veículo de
Comunicação “quebrado “ e levantá-lo em pouco tempo, tornando-o rentável e com
credibilidade junto ao público. Modéstia à parte, nunca falhei nisso. Eu era gerente da Rádio
Santa Cruz, uma emissora muito forte do interior, quando vendemos a emissora para a Igreja
Católica. Fui para lá com a missão de reerguer a rádio e vendê-la. A missão foi cumprida. Não
cheguei a sair de Santa Cruz do Sul, pois o prefeito de então, Sérgio Moraes, me convidou para
assessorá-lo e, também, veio a proposta do Grupo Gazeta de Comunicação para trabalhar lá.
Aceitei as duas propostas. Lá pelas tantas, a rede em que eu trabalhava, antiga proprietária da
Rádio Santa Cruz, quis que eu retornasse para fazer a transição da Rádio Progresso, em Novo
Hamburgo, cuja freqüência foi vendida para o Grupo Sinos, e levar para aquela cidade a
emissora, também de nome Progresso, que funcionava em São Leopoldo. Era uma coisa
totalmente louca e fadada ao fracasso. Deu certo. Depois, prefeito de Santa Cruz me chamou
de volta. Lá fui eu e fiquei em Santa Cruz até ser contratado para coordenar a campanha de
Iolanda e Heitor à Prefeitura de Montenegro. À partir daí decidi fincar pé em Montenegro e
não mais sair daqui. Procurei o Adriano Alves de Oliveira e propus a criação de uma entidade, a
Associação Pró Desenvolvimento de Montenegro, para solicitarmos a abertura de licitação
para a implantação de uma emissora de rádio comunitária aqui no município. E assim foi feito.
Outras entidades participaram da disputa e nós acabamos os vencedores. O início de tudo foi
em 1996 (a concessão de um canal de rádio ou televisão é muito demorada) e se estendeu até
junho do ano passado (2010) quando recebemos a outorga do Ministério das Comunicações.
Daí, era preciso a aprovação do Congresso Nacional. Imagine, num ano eleitoral como fazer
andar qualquer projeto dentro da Câmara dos Deputados e do Senado? Conseguimos. Agora
só resta aguardarmos a finalização de alguns trâmites burocráticos e a finalização do projeto
técnico para a Rádio Montenegro FM ir ao ar. Mas um dos motivos que nestes anos não sai
mais de Montenegro para trabalhar fora, é que a Legislação que regula a concessão de canais

comunitários, diz que os sócios tem de ser residentes no município área de atuação da
emissora. Para trabalhar fora teria de morar neste outro município. Em sendo assim, estaria
enganando um órgão federal, o Ministério das Comunicações, e não gosto destas coisas de
fachada. Preferia carregar um pouco de “pedra” neste período, mas fazendo as coisas com
total lisura. A diferença é que agora vou poder empreender aqui na minha terra o rádio
vitorioso e de sucesso que fiz em tantas outras cidades. É incrível, mas embora tenha sido um
profissional premiado e de longa carreira, a minha própria cidade ainda não me conhece como
comunicador. A nossa rádio vai ser democrática, dando voz a todos os segmentos da
comunidade montenegrina, e lutando sempre pelas causas da nossa gente. Não tenha dúvida
que a Rádio Montenegro FM vai escrever novas páginas na história da Comunicação em nosso
município.

13-Quais os trabalhos que mais te deram gosto em realizar? Todos da área de Comunicação.
Mas os programas de rádio tinha um gosto especial, pois eu ajudava muitas, mas muitas
pessoas mesmo. Tenho histórias lindas sobre isto. E, veja bem, nunca pedi nada em troca,
como muitos fazem: usam a força de um programa de rádio, “ajudam” pessoas, mas depois
querem o voto numa eleição. Em municípios de porte, como Passo Fundo e Santa Cruz, eu
poderia ter concorrido a vereador com todas as chances de êxito. Preferi não trair a confiança
dos meus ouvintes, pois, naquela época, sempre dizia que não os faria de trampolim para
seguir carreira política. Através dos programas de rádio fizemos obras sociais grandiosas,
ajudando famílias e, também, comunidades inteiras. Graças a Deus, tenho muitas e belas
histórias para contar aos meus netos. Pobre de quem não as têm.

14-Voar...O que é voar?O que é falar?O que é ...existir neste lugar e tempo?

Voar... em todas as áreas e em todos os momentos da minha vida acho que sempre voei.
Voar é se superar, vivendo a todo instante uma grande e nova emoção; é o estar no alto,sabendo que no momento de pousar a operação tem de ser perfeita. E o voar te faz sentir mais profundamente a existência, te dando a noção exata do tempo, pois tu te sentes mais gente e gente diferente, escapando da linha da mediocridade, em que tantos fazem questão de permanecer.




. 15-Jalvi...a pior mordida é a do amigo.a pior das traições, das desilusões nem sempre é da ordem passional no sentido sexual.A traição de amigo, quase mata! Para ti...o que é ser e ter amigos?

Ah, Adriana, amigo verdadeiro é coisa em extinção. Hoje em dia sempre há algum tipo de interesse norteando as relações. Olha, tenho muitos conhecidos. Amigos mesmo, o número não equivale aos dedos de uma mão. Ao que parece nos dias atuais as pessoas fazem questão de serem maus caracteres e isso só faz aumentar as traições. Quem me tem por amigo, pode ter certeza que não será traído. Fidelidade é imprescindível. Mas dificilmente se encontra reciprocidade. E às vezes faz uma falta danada um amigo de verdade!

16- Qual a função da informação?Quero dizer...quando a notícia aparece é dela sua conseqüência.Costumo pensar que a notícia é,sempre, a fala que nos alcança em algum momento. A boa, a ruim...A notícia é quase uma dor de verdade que sucumbe a qualquer explicação.Neste sentido aproxima-se da poesia porque nos carrega...sabe-se lá para onde.O que achas disso?

A informação é esta grande alavanca que está, mais do que nunca, movimentando o mundo.
Quando digo isso me refiro a todos os tipos de informação. Já a notícia, a informação
jornalística, nos últimos anos também assumiu grande importância. Antigamente as emissoras
de rádio, por exemplo, priorizavam a música, o entretenimento e os noticiosos não passavam
de um apêndice na programação para mero cumprimento da Legislação. Hoje, não. Temos
rádios que têm 24 horas de notícias. Assim como emissoras de tv exclusivamente noticiosas.
Eu até não diria que a notícia tem uma proximidade com a poesia, mas com uma crônica do
dia a dia.




17-Tem mais alguma coisa que gostarias de dizer em indecentes palavras?

Que nem todas as palavras são indecentes! E a palavra continua sendo a arma mais poderosa
colocada à disposição do povo. Saibamos usá-la com decência para combater os indecentes.

Querido Jalvi...é um prazer imenso te reencontrar!
O prazer é todo meu!

O estranho e inusitado é te encontrar em foto, por email e...não em voz.É certo que ela é apenas um traço que me traz até aqui, lembrando de tempos encantadores,de pessoas que queriam voar.Traz-nos até hoje, em indecentes palavras, em que se ouve uma canção, a melhor delas, o desejo de reencontar. Assim, aqui, me vi em ti, ensaiando, lendo teu texto como “ script”, te recebendo como parte feliz desta cidade, deste lado de mais.Sempre ,por aqui, te aguardo, como a um balão colorido que possa chamar para passear ,pela notícia da vida que se há de falar.Venha sempre!

Beijo com todas as letras

adriana bandeira

POEMAS DE RUA...A CIDADE EM MIM

Os cheiros da casa

Conheço as ruas, as praças.Sei quando dormem e da solidão dos banheiros.Sinto quando amam, quando escondem, quando temem.Se acaso pareça perversa minha ciência estranha, digo-lhes apenas: sinto o cheiro.Sou o cão da palavra que jamais cala a vida da casa.

quarta-feira, junho 15, 2011

Mulher de um homem

Tenho uma canção que se acaso lhes pareça  estranha, derramo a voz na forma humana, que me faz mulher de um.Nem por amor, mas pela verdade, um saber que me faz só, acompanhada de um homem, que mesmo longe não esquece a ternura.Cuidado que não perdoarei se o machucarem!Olhem, avistem, por cima de suas fardas, que aquele que me fez amada não obedece patrão.O homem que amo, a quem pertenço, faz revolução.

segunda-feira, junho 13, 2011

O FRIO FAZ NASCER A TERNURA DO FIO DA PARTITURA QUE AQUECE A CANÇÃO-Falando do tempo das palavras com Lau Siqueira

1-Bem...então hoje tirei a tarde para propor estas perguntas.Precisava
fazê-las numa espécie de hiância que me permitisse todo o tempo do
mundo.Não existe, sabemos...Então temos que inventar este momento
de “ todo o tempo do mundo”.Precisava para que as perguntas tivessem
esta conotação de “ poemas vermelhos”...Sim! Como perguntar ao poeta
que dá este nome às suas produções de agora.quero dizer...o nome de
uma cor, ou melhor, a que surge para cada um.Lau, Poemas Vermelhos
surgem...em que contexto?

R - Poemas vermelhos nascem de um contexto que me parece estar entre
o caos e o acaso. Ou seja: no contexto da invenção poética e artística. O
vermelho me pareceu a cor mais viva para identificar um processo que
é contínuo. Os chamados “poemas vermelhos” que publico no meu blog
são os inéditos. Muito mais que isso, são os recém criados, os criados e
postados naquele exato instante. Jogados na rede para sobreviver ou não
ao olhar mais agudo do próprio poeta e dos leitores do blog. Alguns até
sobrevivem até o próximo livro, outros se perdem ou são sumariamente
deletados. O livro Poesia Sem Pele e o anterior, Texto Sentido foram
alimentados por poemas vermelhos. Portanto os poemas vermelhos
são os inéditos e imediatos que se jogam no impulso, na “metalurgia
da palavra”, para usar uma definião que uso em um poema de um dos
meus livros anteriores. São poemas que fazem parte do meu exercício
cotidiano com a linguagem, fazem parte do meu aprendizado e colocam
a minha poética como um processo, como um movimento da linguagem
no alimento dos meus dias e das minhas intervenções no universo da
literatura.


2-Por qualquer coisa inexplicável sempre pensei que ternura é uma
construção.Quero dizer que não vejo bem como dizer o que é ternura.
Simples como qualquer outro sentimento mas...ternura, para mim, é o
depois de algo; o que refaz ou reinscreve algo da violência,da dor...uma
espécie de amor que se veste com este nome.O que é ternura, para ti?

R – Isso me lembra Mário Quintana: “como vou explicar uma nuvem?”
Ternura para mim é um elo de silêncios para a compreensão do
incompreensível e do ato mais sublime da existência que é, em verdade,
o amor enquanto atitude. Portanto, é ou não uma nuvem? Não existirá
ternura em alguém que não reconhece o amor enquanto valor supremo
de mobilização do que conhecemos e do que ainda não conhecemos em
termos de raça humana. É o reconhecimento e a compreensão da nossa
fragilidade e ao mesmo tempo a nossa maior couraça, a certeza que os
atos de ternura somente acontecem após um desnudamento mais denso
diante da barbárie das relações cotidianas. Talvez a ternura seja a nossa
única e verdadeira coragem.


3-A história de cada um não conta por si só o que nos registra censuras
ou nos autoriza transgressões. Por vezes, em algum tempo, podemos
pensar ter transgredido e, logo, depois de alguns minutos, dias ou
anos...nos perdoamos.Estas imagens permeiam ações e uma espécie
de destino..como o que construímos no dia a dia.Lau,quais tuas
transgressões?

R – As minhas transgressões se processam através da linguagem
poética, porque é lá que revelo o sacro e o profano da minha vida, do
meu pensamento, dos tencionamentos que crio com a afirmação da
linguagem enquanto forma de transbordar as minhas dúvidas diante
de tantas certezas absurdas criadas para o sufocamento dos códigos da
invenção até e, talvez principalmente, da relação do ser humano com
ele mesmo. Minhas transgressões se voltam sempre para a profanação
do meu umbigo, para os sarcófagos do meu ego. Neste sentido creio
que o meu propósito é sempre “transgredir-me”. Numa estação onde
permanentemente posso jogar meus olhares sobre os abismos que nos
cercam em termos de conhecimento e desconhecimento da causas e
defeitos dos processos vividos pela humanidade desde que a memória
do mundo existe. A poesia é a minha transgressão mais radicalizada.
Aliás, todo mundo transgride ao nascer. Respirar é, provavelmente, uma
transgressão coletiva, contida pelos abalos do homem espalhados pelo
universo.


4- Neste aspecto, seguindo nesta linha de pergunta, confesso que
não é raro pensar que a palavra tem um tempo rsrsrsr. É...algo assim
como “um eu”, o do discurso, que se autoriza, em dado momento, a
falar ou escrever algo.Este algo...são palavras, sons, significantes que,
naquele “ tempo” apresentam-se.O que pensa disso?

R- Sim, penso que cada palavra tem o seu próprio tempo porque o
significado não é, na maneira poética de expressão, alguma coisa estática.
Toda palavra tem seus próprios movimentos e nisso a invenção de
um tempo particular. O tempo das palavras na construção do poema
não é, de forma alguma, um tempo linear. Isso deve ser considerado,
especialmente, na leitura crítica de um texto. Mesmo na prosa, mesmo no
discurso técnico, as palavras tem um tempo que conduz ao movimento.
Caso contrário não haveria evolução na ciência e no conhecimento. Talvez
o papel da palavra na evolução da ciência explique melhor o seu tempo
que as teorias da literatura.


5 - Aí, lembrei também da proposta do teu blog poesiasim de escrever e
reescrever e mudar... Como é esta idéia?

R – Um poema nunca é apenas um poema. Assim como o autor não
é apenas um autor. O poema está sempre dividido entre a escrita e a
leitura. Portanto, acho que é a partir da leitura que o poema começa
a ser realmente escrito e esse é um princípio permanente e mutante
No blog, penso que meus poemas estão abertos às modificações ou
mesmo às sugestões. Mesmo poemas já publicados em livros anteriores
eu alterei para publicações no blog e acho que o poeta deve se permitir
invasões, até mesmo de leituras equivocadas dos seus poemas. Esta
leitura supostamente equivocada poderá ajudá-lo a compreender o
incompreensível que é, em suma, a razão do poema. Isso não é uma
regra porque se fosse estaria negando a sua própria natureza, mas no
blog e nos meus livros, creio, eu continuo a caminhada em busca dessa
nossa grande utopia que é a construção do poema. Isso é dinâmico.
O verso de hoje nem sempre contempla o poema de amanhã. Tudo é
passível de um destensionamento de conceitos para que o procedimento
criativo se perpetue enquanto processo e não enquanto gradeamento da
imaginação. A imaginação se veste de signos, desnuda-os. Acho qu estar
preso a conceitos estabelece as bases do preconceito estético que é, em
última análise, o inimigo maior de qualquer processo criativo. Que o diga
Glauco Mattoso, um sonetista pra lá de inventivo.


6 - Em algum momento sei que a poesia, de cada um, faz revolução.
Penso que o poetar é algo próprio ao humano e capaz de produzir
movimentos inimagináveis. O que é poesia para ti?

R – A poesia é um salto no abismo. Uma indefinição e uma inutilidade
de hálito imprescindível. Mais uma vez fico com uma frase do Mário
Quintana para fugir dessa armadilha: “a poesia se resume na procura da
poesia”. Ou seja: não sei o que é poesia e me conformo porque Mário
também não sabia. Aliás, não tenho certeza se o que eu escrevo é poesia
e, te juro, não estou nem aí. Só sei que a poesia não tem culpa alguma da
minha estupidez numa resposta como essa.


7 - O lançamento do livro “ Poesia sem Pele” em João Pessoa trouxe
uma inovação. Por incrível que pareça, em algum sentido, estava o
reconhecimento de que existe algo em comum, que recebe à todos,
digamos assim. Eu tinha um amigo que não possuía a última camada da
pele. Uma doença que o acompanhava desde o nascimento. Poderia ter
pena mas...percebi que à todos falta a última camada da pele, a que
deixamos com a placenta. Somos, sem exceção, frágeis. Para ti,Lau...o
que seria este universal que à todos recebe?

R – Lancei o livro em João Pessoa, num manicômio. O lançamento esteve
integrado na programação da Semana de Luta Antimanicomial, numa
programação que celebrou a vida, com Tom Zé, Babilak Bah e outros
artistas. E o lançamento foi dedicado aos que despiram todas as camadas
da pele para sentir o ferro em brasas da hipocrisia, do preconceito que
existe com a loucura e com a loucura que abriga cada preconceito. A arte
é a cura numa sociedade doente de tudo. É universal, portanto, pra mim,
misturar as minhas atitudes às minhas crenças na vida, no que a vida tem
de visível, de palpável, mas principalmnente no que tem de mistério,
de invisível, de estrangulamento de uma racionalidade que geralmente
somente se afirma na contradição.


8 - Como foi o lançamento aqui na Festipoa?

P – Foi maravilhoso! Um momento de grande alegria pra mim, lançar um
livro no “Hotel Majestic” que hoje é a Casa de Cultura Mário Quintana. Era
como se estivesse escutando Sapatos Floridos caminhando pelo silêncio
na noite do dia 5 de maio. Sou profundamente grato à minha editora, a
escritora talentosa, Laís Chaffe. Sou profundamente grato ao Fernando
Ramos, por ter me incluído na programação. Foi muito especial depois
de 26 anos longe dos pagos, lançar um livro na minha terra e me sentir
acariciado pelos meus irmãos gaúchos, escritores ou não. Não tem preço
uma emoção assim. É reconhecimento de que não estamos sós.


9-Por alguns momentos nos falamos rsrsrsr. Pude testemunhar uma
certa nostalgia... das ruas de Porto Alegre, talvez de poemas que ainda
estavam sendo feitos, naquele instante e, já indo embora por estarem
criados, retratavam a saudade nos olhos de água. Estou correta na
minha impressão?

R – Corretíssima. Eu ando pelas ruas de Porto Alegre como se estivesse
buscando meus antigos passos. Nunca consegui me desapegar da cidade,
dos seus monumentos, da sua arte, das suas ruas, dos seus morros e deste
estuário de águas infelizmente não muito confiáveis que é o Guayba.
Minha história é meu único bem. Porto alegre faz parte de forma intensa
dessa história que já chega aos 54 anos. É uma das fontes supremas da
minha poesia, com certeza.


10- Conseguiste um exemplar de um cara...rsrsrs como era o nome dele
mesmo? Achei encantador que fizeste a referência sobre teu amor ou
ternura por Mário Quintana. Poderia nos dizer qual a relação que tens
com a letra de Mário?

R – É verdade, cheguei na Casa de Cultura Mário quintana e encontrei
logo o livro Sapatos Floridos que, no pensamento e na minha caminhada
da casa da minha irmã, na Hilário Ribeiro, até a Andradas vinha lembrando
que havia extraviado pela vida. O livro estava lá, olhando pra mim e
pude adquiri-lo novamente. Tenho uma relação crítica com a poesia do
Mário. Não gosto de tudo que ele escreveu e não poderia ser diferente
porque Mário, talvez, tenha sido um dos poetas de maior produção e
mais publicado no seu tempo. Mas, não é diferente de outros poetas
que admiro, também. “Não gosto de tudo que gosto”, eu diria. Ou não
gosto de tudo nos escritores que admiro. Seria hipócrita negar isso. Muito
menos da minha própria produção, sobre a qual tenho espasmos às vezes.
Chego a sentir “depressão pós parto” após publicar um livro. O fato é
que Mário era uma figura extremamente poética. Seu caminhar, seu
jeito e de certa forma até mesmo seus preconceitos que eram também
bastante agudos e estavam presentes na sua poesia. Acho que ele foi, de
certa forma, pouco compreendido porque não há como analisar a obra
de qujntana sem considerar que ele fazia parte da obra. Ele era o seu
principal poema. Se me influenciou? Creio que sim, como todos os poetas
que li. Talvez ele tenha me ensinado a não ter receio de ser poeta e a
saber que poeta é ser inevitavelmente poeta.


11-Pois é... letra... Letra é traço, marcado a ferro na pele. Mesmo que
digamos que não, ali está como parte do rosto, da voz, do olhar. Como
construíste tua letra, enquanto tal?

R – A única certeza que tenho, talvez, é que não construí nada e que talvez
nunca construa. Na verdade, penso que vivo a poesia enquanto processo
e que devo manter as portas e as janelas abertas para que todos os ruídos,
todos os ventos possam me fazer entender que a poesia será sempre
uma folha caindo no alento da sala, soprada pelas possibilidades de
algum poema. Mesmo que jamais seja escrito. A minha letra talvez nem
exista... é um processo de contrastes e de permanente desconstrução.
Uma constância de atitudes que me levam aos goles da insônia e aos
firmamentos de muitos livros lidos e vividos.


12 - Pois bem... li emocionada um texto teu no blog. Falavas do
lançamento em João Pessoa e de teu envolvimento com isso que
denominam loucura. Digo “ isso que denominam” porque é certo que
alguns escolhem chamar a diferença gritante, como loucura. Fiquei
emocionada e um tanto identificada. Pois bem, poderias nos falar
um pouco sobre a compreensão que tens sobre “ os loucos”, “ as
loucuras”...”todos os nós”?

R – Talvez eu não tenha compreensão alguma, mas certamente tenho um
profundo sentimento quanto ao sofrimento de alguém que é mutilado
para uma adaptação violentamente forçada aos costumes de uma
civilização sem moral para condenar a loucura. Não creio que se possa
definir conceito de loucura num mundo absurdamente louco, onde os
valores humanos se desintegram nas páginas dos jornais e não permitem
a formação sólida de uma camada social que possa servir de suporte
para a dignidade enquanto valor humano. A doença mental é por demais
cruel porque, muitas vezes, demora muito para se tornar visível e mais
ainda para se tornar compreensível. Algumas a doença é a causa, noutras,
o efeito. Então, o que o sistema fez com os que considerava loucos?
Encurralou-os no confinamento, para que pudesse continuar exercendo
sua balbúrdia diante da perplexidade de alguns e da indiferença de
muitos. Loucos são os muros que construímos para cometermos atos de
lasceramento da nossa igualdade, de raça, de gosto, de álibis. Ou será que
os religiosos que promoveram a inquisição eram pessoas sadias? E os que
promoveram o holocausto, eram mesmo normais? Quem são os loucos?
Quem de nós?


13 - Iniciaste a fazer poesia ou a poesia te iniciou? Rsrsrsrs

R – A poesia é um exercício permanente de espanto e, portanto, de
humanidade. A poesia tenta me iniciar a cada dia, espero que nunca
desista de mim. Afinal, somos aprendizes dos nossos próprios erros.
Minha poesia é a soma dos meus erros, dos meus átomos e das minhas
distenções. A poesia me inicia tentando unir o que quando toma corpo,
explode em mil artículas perdidas na aridez dos dias. E a poesia vai me
indiciando, sempre... me iniciando.


14 - Teus livros, as filhas, neta, namorada... O que compõe teu universo
de escrita?

R – O que compõe o universo da minha escrita é a vida e suas linguagens,
o trabalho com a palavra na escrita ou na tentativa. Minhas filhas, meus
amigos, minha neta e minha namorada fazem parte do que se processa
nesse liquidificador de possibilidades. Não confundo as coisas. Acredito
nisso, mas também desconfio muito.


15-Falávamos sobre “revide” rsrsrs. Dizias de uma impossibilidade, na
infância, de estudar música...Acho que foi isso,né?...Então comentei:
sempre é um revide. Concordas com isso? Sempre é um revide, uma
transcrição, uma restauração?

R – Sim, acho que na verdade eu poderia ter estudado música. No
fundo acho que ainda posso, mas talvez nem queira tanto quanto penso
que quis. Naquele tempo a compreensão da minha mãe era outra. Ela
queria que eu fosse engenheiro. Na verdade ela queria que eu quizesse
ser engenheiro. Não me pergunte o porquê. Talvez pelo pai dela, meu
Vovô Marcos (o Tata) ter trabalhado como operário na construção da
Ponte Internacional Mauá, hoje tombada. Certamente por querer para
mim um futuro sólido. Por isso ela pensou o oposto do que eu sou. Ser
engenheiro era não correr tantos riscos quanto um poeta. Ser poeta foi,
talvez, um drible naquela criatura doce que era minha mãe. Quando ela
ainda era viva, fiz poemas para ela. Ela curtiu muito, também, o filho
que escolheu a arquitetura dos versos. Era uma mulher maravilhosa e
profundamente boa, como uma mãe deve ser. Me ensinou os caminhos
do amor e da paciência. Nesse caso, foi revide e restauração. E ela é que
foi a engenheira.


16 - Percebi que transitas em vários guetos, em vários grupos, em várias
palavras.rsrsrsr. É como se estivesses no mundo, de fato, existindo a
cada instante. Nisso não há mais tempo para ...bobagens? rsrsrsr.Lau, o
que existe de maior valor na tua história de vida?

R-Sem dúvidas: as minhas filhas, a minha neta, a minha família, os meus
amigos e amigas, as pessoas que conheci e que me ajudaram de certa
forma ou de todas as formas a estar aqui agora respondendo tua
entrevista, em pleno mês de junho, sem camisa, pensando no sul gelado,
mastigando as respostas das suas perguntas instigantes para que sejam
minimamente digeríveis. As pessoas que eu amo são o que mais valorizo.
A minha responsabilidade sobre o mundo é algo que não abro mão. Nem
para um trem, como se diz. Disso decorrem todas as coisas. Até mesmo a
minha poesia e outras bobagens que tento esconder, mas nunca consigo.
Ainda bem, porque do contrário eu não existiria. E eu inexisto mesmo!


17 - Certa vez perguntei: Ô Lau... porque o risinho? Respondeste: porque
sou risonho rsrsrs...Preciso confessar que...eu também. Há sempre
um chiste, há sempre o riso, há sempre o cômico. Ele é o infernal!
Rsrsrsr.Como situas o cômico na vida e na escrita?

R – Considero, como Fernando Pessoa, que ser poeta é uma vocação.
Todavia, algumas vezes acho que tenho mais vocação para palhaço que
para poeta. As pessoas que convivem comigo sempre riem muito porque
eu fico o tempo todo tirando onda, pegando no pé, gosto de fazer rir
e gosto de chorar junto, quando preciso. Vivo de transbordamentos.
Dos sentimentos baixos o que menos suporto é a covardia. Não suporto
também a hipocrisia e acho que as questões coletivas devem sempre ser
priorizadas. O cômico na minha vida não permite a diluição dos meus
princípios. Acho que a vida é bela demais para gastarmos o nosso tempo
com atrocidades, com desrespeitos, com violência. E acredito que essas
são as causas da tristeza maior no mundo. Devemos nos conceber na
alegria e na intensidade de viver cada momento. O riso deve ser sempre
uma partilha da alegria de viver e nunca um produto do sarcasmo.


18 - Não quero perguntar sobre teus trabalhos mais significativos. Mas
vou fazer isso porque chamo de trabalho também o tempo em que as
coisas vão “cozinhando”, o vinho vai envelhecendo e... Então: qual o
trabalho, que na tua vida, foi ou é mais significativo?

R – Com certeza, aquele que ainda não escrevi e que nem sei se vou
conseguir escrever algum dia. Se considerarmos que o leitor ou a leitora
são realmente os parceiros na construção de uma obra poética, deixo essa
resposta para quem tem a ousadia, a coragem de abrir meus livros que,
infeliz ou felizmente, a maioria já esgotaram suas edições e estão por aí,
espalhando inquietações pelos rincões.


19-Quem é o poeta?

R – Boa pergunta! (Péssima resposta.)
20-Gostarias de dizer mais alguma coisa?


R – Só uma perguntinha: Tu tens mesmo coragem de publicar isso no teu
blog?

(rsrsrsrsr)...Ô,Lau!...rsrsrsr

Agradeço tua indecente palavra, tua letra sem pele, sem medo do frio
que cala; tua denúncia incontida que grita todos os dias no vermelho
de dentro,nas cores que hão de vir.O verbo em resquício: nunca
partir!,numa desistência temerosa de perder a razão.Ela só existe quando
construída aos dias, no trabalho da ternura esculpida, como desenha tua
mão.Recebo-te emocionada, em parte despida,em parte encantada, pela
letra do dia que faz nascer poesia onde eu mesma queria ter inventado
existir.Volte sempre,Lau!
Beijo com todas as letras
adriana bandeira

domingo, junho 12, 2011

Velho quintal

Braços adormecidos, meus,chegavam primeiro.Em concha carregando sementes, até o quintal da luz diferente, onde restavam meus anéis de sol.Cavando rápida, espada, arma adormecida enquanto estrada, rasgava os sulcos da coroação.Não há tempo para plantar e embora soubesse, as que pudesse, haveria de fazer valer.E foram duas, três, talvez muitas quando os braços,meus passos, quedaram sem volta!Era a hora da partida, era a hora de  voltar à morte, como sopro de vida.Algumas, pequenas e fortes, geraram canções.São desejantes estas notas musicais!Outras me surgem assim de visita, depois que virei árvore escondida, da minha melhor maçã.

sexta-feira, junho 10, 2011

Um " és", para os que escutam corações

Não sei de onde as cores te invadem, numa lembrança sem rumo do que ainda, nunca aconteceu.Por sorte estamos felizes e seguras minha mão sem medo de existir.Posso rir alto com pena do tempo e sonhar com um jeito de nunca dizer adeus.O dia termina  e não lembro mais de mim, antes de tornar-me em ti.

Destino

Subi a esquina, errei na rua.Desci antes do tempo...e o trem nem passa mais por aqui.Começo a construir.

De onde eu vim

Vim de onde nada existia,lá de onde vazavam os olhos, as tardes, os dias...até surgir este cordão de letra faminta.

Do pó...

Vez ou outra ouço o ranger da pedra tecida.É dela a verdade adormecida, pele recortada da cinza.

terça-feira, junho 07, 2011

O SOM DA PRIMEIRA CASA,ESQUINA,ESTRADA:O LUGAR DE EXISTIR- Conversando com Davi,Veloso,Nino,Daguia e Nilton.




INDECENTES PALAVRAS- Primeiro pensei em fazer algumas perguntas, deixá-las prontas e...depois achei melhor que elas surgissem na rua também...porém, aqui estão, algumas feitas e casa e outras...nesta possibilidade de surgirem.Para vocês, qual a diferença entre a casa e a rua?

DAVI- A diferença é que em casa se estuda sozinho. Não tem como te sensibilizar...te motivar.Na rua...soltinho rsrsrsrs. Está para as emoções...
NILTON- Em casa o universo é reduzido...sem possibilidade de dividir a música.Não se guarda para si mesmo.
NINO- Em casa estudamos...na rua apresentamos
NILTON- Em casa os familiares reclamam do barulhos.Tocar em casa...tocar na rua...O estudo está sendo proveitoso.O pessoal acompanha o processo de estudo.As pessoas dizem se melhoramos ou não... rsrsrsrsrrss.
VELOSO- A rua envolve uma liberdade e em casa...escolhemos.Na rua encontramos os amigos e...tocamos.Existe uma liberdade para brincar com a música.

INDECENTES PALAVRAS- Isso diz respeito ao público e ao privado, ao íntimo espaço do si mesmo e ao que constitui o si mesmo: a língua falada por todos, e todos...é a rua! rsrsrsrsrs.Neste aspecto, falando de música, a linguagem da música antecede o músico, já está ali antes...e determina algumas coisas.O que, para vocês, determinou a escolha por um instrumento?

DAVI- O meu é machista!rsrsrsrs É o instrumento que te escolhe! A música me escolheu... Todo ser humano nasceu cantando, ele veio falar depois...Imitava os passarinhos, os sons da natureza...Todo ser humano é...músico.É...eu só não escolho a música quando me pagam.Com a bateria foi assim.Meu primeiro instrumento foi o sax...a bateria estava lá...E aí...É um casamento! Se escolhesse outro instrumento...pareceria traição.Sempre penso como transmitir à ela.Tudo é percussão: o barulho das pessoas, o som das coisas...A música é uma matemática.A música em si é a matemática.Não tem fim!
NILTON- A sonoridade do sax, um instrumento romântico, músicas tocadas com bom gosto...É difícil escutar um saxofonista tocando ruim.A sonoridade reproduz a voz humana.O sax ...canta! rsrsrsrsrsrr
DAVI- Então dá prá dizer que todo instrumento quer reproduzir a voz humana.O instrumento explica os sentimentos da alma.Romântico..pq é calmo,relaxante...não é fofoca íntima? rsrsrsr”Lupicínio Rodrigues” rsrsrsrsrsrs...Para nós, na brincadeira, música romântica seria isso..rsrsrsrsrs.
VELOSO- O sax faz ...solo.Uma só voz, fala...Só dá para fazer uma nota por vez.
DAVI- É um instrumento de melodia.O instrumento do ...jazz.
VELOSO- Concordo com o Davi...Até os 13 anos eu não dava bola para a música...Nesta época existiam os bailes de formatura.No baile de formatura da minha irmã, pela primeira vez ouvi um grupo, ao vivo.Aquele solo de guitarra...Me pegou! Tanto pedi que minha mãe  me colocou numa aula de violão...Não aprendi!Não conseguia...Depois de algum tempo, encontrei-me sozinho com a guitarra e ...ela me escolheu!Sou de Uruguaiana e comecei a participar de programas de rádio ao vivo....comecei a colocar na prática o autodidatismo...Meu percurso de aprendizagem foi ...estudar em casa e tocar nas casas de mulheres, casas noturnas,cabarés,como chamavam.Os músicos tops....estavam lá! rsrsrsrrsrs Os músicos ficavam lá...uma semana, duas...

INDECENTES PALAVRAS- Era uma...pensão ?rsrsrsrsr

VELOSO- Transformava-se! rsrsrsrs
DAVI-  O beco das garrafas era assim...no Rio de Janeiro.
NINO- Como eu gostava de cantar...precisava de um instrumento de acompanhamento.

INDECENTES PALAVRAS- O sax é sozinho...o violão...acompanhado.rsrsrrsrs

NINO- Na década de 60 tocávamos nas calçadas...e alguém sempre sabia tocar.Aquele era o cara!Naquela época os bolinhos nas calçadas eram permitidos.Hoje acho que não!Nunca estudei música.Aprendi a tocar assim.Comecei a tocar...uma amiga me dava as notas principais....fez os desenhos e eu reproduzia.Eu assistia os conjuntos e  observava.É pura abstração!


INDECENTES PALAVRAS- Tocar um instrumento ...a sonoridade tem um alcance privilegiado.Falo do alcance subjetivo, do “ tocar” no outro de forma única que não está determinada pelo som ou nota mas ...pelo recebimento de melodia.Para alguns um som pode ser harmonioso e belo, para outros...Vocês sentem-se tocados pela música?Quais?De que forma?

DAVI- Sentimos! Muito.
NILTON- a sonoridade dos instrumentos...alguém já imaginou um filme sem trilha sonora?Todas as ações, emoções são representadas por um tipo de som!Um momento de pavor...uma outra emoção...alegrias...Sou levado pelo instrumento.
DA GUIA- Comecei aprender tocar violino há pouco tempo.Venho para a rua e me sinto como se estivesse na escola aprendendo português, pela primeira vez.

INDECENTES PALAVRAS- Uma alfabetização?

DA GUIA- Sim...é como se eu estivesse me alfabetizando num outro sentido.Penso que estou aprendendo a escrever ou a falar, matemática...
DAVI-Tu te deixa ir...tipo um orgasmo...rsrsrsr. A emoção é tanta que rola sentimentos...Onde estive...é isso que me pergunto!
VELOSO- Quando tu estás com o instrumento...tu estás buscando o conhecimento daquilo!

DA GUIA- Comecei a tentar entender a teoria...depois comecei a tocar...

INDECENTES PALAVRAS- Estaria tomado pelo aprendizado, neste momento?

NINO- É...para te entregar para a música...tem que estar com ela dentro de ti.
VELOSO- Eu sou um aprendiz em violoncelo! Dá uma ansiedade louca!Eu quero ter o mesmo rendimento que com a guitarra!

INDECENTES PALAVRAS- Por que...a rua?

NILTON- Do ponto  de vista aprendiz...vou usar uma frase do Da Guia: desinibição.É um complemento às aulas...um “extra classe importante”rsrsrrs .
DAVI- A rua foi para o artista o lugar de subsistência, do dia  de hoje.A rua não precisa de repertório, as pessoas passam e algumas músicas são bem aceita.O rolar o chapéu, as moedinhas...Dá a subsistência do dia de hoje.Como no Brasil não temos esta cultura, o artista brasileiro acha que indo para rua é...pedir esmola.o pessoal que passa...acha que botar cinqüenta centavos...é pouco.Acha que não vale a pena.O serviço de rua é para que ele seja reconhecido, o artista, pelas pessoas comuns,como qualquer um.O artista de rua não pede para ninguém.Ele  só é reconhecido pelo povo.O trabalho de rua é feito das seis às sete da noite.As pessoas saem do trabalho e ficam ...mais calma.

INDECENTES PALAVRAS- Poderiam contar um pouco da história  deste espaço aqui?Falo deste agrupamento no café da cidade, rsrsrsrs Num café só para homens?
NILTON-  Quem que disse?Não tem placa!rsrsrrs
DA GUIA- o café é que é o culpado! rsrsrsrrs O café sempre foi um ambiente dos homens.Na época as mulheres não saíam...esta liberdade é um tanto assustadora, hoje.Antigamente eu mandava nelas...agora eu tenho medo delas.Ela nos intimidam na  sua liberdade.Tudo isso vai passar depois que “ela se regularizar”...

INDECENTES PALAVRAS- Quem regulariza a mulher? rsrsr
(risada geral)
INDECENTES PALAVRAS- Cá entre nós...Isso é uma coisa um tanto Machista,não? Rsrsrsr

VELOSO- Eu entendo mais do meu instrumento do que da mulher rsrsrs
DAVI- O ponto é...masculino.A esquina democrática, a boca maldita...a florida...Aqui é livre...mas, é um ponto masculino!

INDECENTES PALAVRAS- Ah! rsrsrsr.O ponto é masculino! A vírgula..?
(muito riso e som de instrumentos.Os rapazes já começam a se impacientar e a tocar alguma coisa ,intercalando as respostas com o sons)


INDECENTES PALAVRAS- O que é  a ....mulher?



DAVI- diz que na Bíblia as coisas estão mudando srsrsrsrs
DA GUIA- O  motivo da minha existência! Sem ela eu não estaria vivo.
VELOSO- Prá mim é a razão principal da minha existência...Sem mulher é como mineral sem gás..
(risadas)
NINO- É o outro lado da mesma moeda.
NILTON- A rosa que floresce meu jardim...rsrsrsr.É o elo de união...sentimentos.

INDECENTES PALAVRAS -Pois é...nossa cidade carece de espaços assim, embora daqui saiam músicos e artista brilhantes.Qual seria a causa disso?

DAVI- Esta falta é geral.Não é só Montenegro.A imagem está no lugar do espetáculo humano.E o artista sumiu.Então...facilitou o instrumento,professores...mas não  a vida do artista; lugar do artista.

INDECENTES PALAVRAS-Quais os projetos?
NilTON- Nada é programado.É espontâneo.Aleatório...Penso: vou levar o instrumento ...vou brincar.
DA GUIA- Aula de desinibição...para enfrentar os professores lá na Fundarte!rsrrsrs
VELOSO- Acho que isso  de se reunirem,vai acontecer naturalmente.Este prazer tendem a se repetir...

INDECENTES PALAVRAS- Qual a diferença entre a música e a mulher?

VELOSO- Nenhuma!
DAVI- Todo músico sonha em ter uma mulher...
DA GUiA- Se eu soubesse isso...
NILTON- As duas coisas desafinam...sai do tom...tem que afinar!

INDECENTES PALAVRAS- mas que coisa! ( rsrsrsrs)..Isso é coisa que se diga,Nilton! Homem não desafina!
Estes dias eu e Lucimaura encontramo-nos por acaso e sentamos para assistir alguns tocando em frente ao café.Era verão e pedimos uma cervejinha rsrsrsrs .Ouvimos das mulheres que passavam ...e não dos homens, algo assim:  “que horror!” rsrs
(risos e música!)...se quer coisa melhor?
Quero agradecer por esta ternura, esta forma de amor especial que faz com que tenhamos a música na calçada; esta voz diferente de cada um dos seus instrumentos, enquanto sonham com a mulher, a cidade e as letras que ainda não conhecem. Só me escapa um pouco uma reflexão pequena de que se a música no café dos homens se espalha, os pontos também são falas e recebem à todos nós.
Agradecida pelo acolhimento, pelo café, pela delícia de estar entre vocês.
Beijo com todas as letras
adriana bandeira